VARIG: O LOGOTIPO REJEITADO ( * Originalmente publicado em JAN/2014 )
Por Marcelo Magalhães
A rosa dos ventos, ou “estrela da Varig”, logotipo adotado pela aérea gaúcha em 1962, tornou-se conhecida nos quatro cantos do mundo, projetando no exterior a imagem de um Brasil pujante e moderno, ao mesmo tempo consolidando a imagem da companhia como a flag carrier do país durante as décadas seguintes.
Com efeito, na primeira semana de junho de 1962 era publicado um anúncio, veiculado nos principais jornais do país, onde o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) informava ter instituído um concurso público para a realização de um novo logotipo para a Varig. Na oportunidade, o instituto convidava artistas plásticos, desenhistas e arquitetos a tomarem parte do certame, aduzindo que o prazo para tomar parte do concurso encerrava-se em 31 de julho. Como prêmio, seriam oferecidas passagens à Nova Iorque e Buenos Aires, respectivamente para o primeiro e segundo colocado na concorrência.
O Edital do IAB, onde foi anunciado o concurso para a escolha do novo símbolo da Varig (Correio da Manhã, 13-JUN-62)
Até então, a marca de identificação da Varig era uma figura humana alada, pintada em tamanho reduzido na cauda das aeronaves, e que ficaria popularmente conhecida como o “Ícaro”, figura da mitologia grega.
O Boeing 707-441 PP-VJA, visto em voo de provas na região de Seattle Puget Sound, antes da entrega com o símbolo do Ícaro na cauda e no disco oval, próximo à cabine de comando.
Mas mesmo antes do concurso para definir a nova marca da Varig, percebe-se que a rosa dos ventos estava fadada a se tornar o verdadeiro logotipo da empresa – em detrimento do eventual símbolo a ser escolhido pelo concurso patrocinado pelo IAB.
Ocorre que em 19 de janeiro de 1962, Ruben Berta, presidente da Varig, comunicava ao então DAC (Departamento de Aviação Civil), a separação da companhia em duas grandes divisões: RAN (Rede Aérea Nacional), responsável por todas as operações domésticas e a RAI (Rede Aérea Internacional), dedicada às operações para fora do país.
A fim de dar publicidade a essa nova organização interna da empresa, na mesma semana em que era publicado o edital do IAB, a Varig veiculava nos principais veículos da imprensa escrita uma propaganda informando sobre a RAN, com a foto de uma aeromoça e, pela primeira vez, com a rosa dos ventos em destaque no anúncio (repetida como um broche no chapéu da aeromoça), ao lado do nome “Varig”. A marca que se tornaria símbolo da empresa era apresentada pela primeira vez ao público, sem qualquer alvoroço. Percebe-se, assim, que a princípio, a “estrela da Varig” estava associada à Rede Aérea Nacional.
A estreia da Rosa dos Ventos em anúncio da Varig, na mesma semana em que lançava o concurso para definição de seu novo logotipo! (Diário de Notícias de Porto Alegre, 08-JUN-62)
A primeira aeronave a estrear o novo símbolo foi o DC-3 PP-VBP, ainda em maio de 1962. Depois a marca foi estendida aos L-1049H Constellation herdados da Real e Caravelle.
Mas e quanto à marca a ser definida pelo concurso do Instituto dos Arquitetos do Brasil? A concorrência foi levada a cabo regularmente, tendo sido submetidos nada menos do que 777 propostas de emblemas. O resultado do certame foi divulgado pública e solenemente em ata datada de 13 de agosto de 1962, na qual o IAB informava que o primeiro colocado havia sido a proposta do Sr. Alexandre Wollner, conhecido artista plástico nacional e designer gráfico, professor durante muitos anos do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, formado na Escola Superior de Desenho de Ulm, Alemanha. O segundo lugar ficou com o professor e gráfico Aloísio Magalhães.
O símbolo que venceu o concurso do IAB para escolha do novo emblema da Varig |
O símbolo vencedor desenvolvido por Wollner assemelhava-se a um losango, secionado ao meio por uma linha em forma de “v”, e tinha o seguinte significado, segundo o artista:
- Losango geral, representando a bandeira brasileira, tendo em cada ângulo os pontos cardeais;
- A forma superior, acima do traço branco, é Delta, forma de avião;
- A lista branca, espaço branco, tem forma de pássaro e “v”;
- A forma inferior, abaixo da lista branca, é o logotipo “Varig”.
Raro desenho de como seria a nova pintura da Varig, aplicada ao B707-441 PP-VJA, caso tivesse sido utilizado o símbolo desenvolvido por Alexandre Wollner.
No entanto, embora vencedor, o símbolo criado por Wollner nunca viria a ser utilizado na identificação visual da empresa, preterido pela famosa Rosa dos Ventos. Ela foi escolhida pessoalmente por Berta, que tinha para todos os efeitos a última palavra na empresa por ele dirigida. Os pilotos, no entanto, exigiram que o antigo “Ícaro” fosse mantido de alguma forma na pintura dos aviões, tendo Berta transigido nesse ponto, ficando a figura dentro de um disco oval, próximo às janelas da cabine de pilotagem, com a rosa dos ventos em destaque na cauda.
Professor Alexandre Wollner, em foto de 2011, autor do desenho que nunca foi utilizado pela Varig.
Desenvolvida pelo artista plástico gaúcho Nelson Jungbluth, diretor de propaganda da Varig, a estrela de quatro pontas, simbolizando os pontos cardeais, tornaria os aviões da Varig reconhecidos imediatamente nos mais diversos aeroportos do mundo pelo qual se estenderia a malha da empresa.
A Rosa dos Ventos, acabou sendo a marca da Varig, que levou a companhia a ser conhecida no mundo inteiro.
Finalmente alguns dos aviões da GOL, companhia que em 2006 adquiriu as rotas e a frota da Varig, usaram a rosa-dos-ventos de forma descaracterizada e sem o glamour de antanho, e poucos sabem que aquele símbolo ainda hoje icônico na aviação, não era para ter sido a marca de identificação da empresa.
O Boeing 767-27G(ER) PR-VAC, com rosa dos ventos da era "GOL", visto em Guarulhos, agosto de 2008 (foto Marcelo Magalhães)
Nota do editor: Este artigo foi originalmente publicado em JAN/2014 e estamos reproduzindo novamente após cinco anos, por sua importância histórica.
Marcelo Magalhães publicou recentemente o livro "O Boeing 707 e sua Operação no Brasil", resultado de mais de oito anos de extensas pesquisas em diversas fontes e colaboração de inúmeros entusiastas, fotógrafos e pesquisadores de renome nacional e internacional, além de tripulantes que voaram a aeronave. A inédita obra cobre os mais de 50 anos de atividades do clássico jato no país, e tem capítulos dedicados à cada um dos operadores brasileiros do 707, com centenas de fotografias - muitas delas inéditas, ilustrações especialmente produzidas pelo artista norte americano Jennings Heilig e depoimentos dos protagonistas da história da aeronave no Brasil.
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